No último sábado (05/11), mais de mil pessoas participaram do Segundo Manifesto em Defesa do Rio Doce. Iniciativa da Diocese de Colatina, o manifesto tem por objetivo cobrar das autoridades atitudes concretas para que os responsáveis pelo desastre socioambiental ocorrido em Marina sejam responsabilizados e punidos, bem como, alertar sobre os riscos da atividade mineradora.
Rompimento da barragem completa um ano
No dia 05 de novembro de 2015 uma barragem pertencente à Samarco, empresa controlada pelas multinacionais Vale e BHP, na qual continham rejeitos provenientes da atividade mineradora exercida pela empresa se rompeu, formando uma enxurrada de lama devastadora que varreu do mapa o distrito de Bento Rodrigues, localizado próximo a barragem, no município de Mariana/ES. A enxurrada ceifou dezenas de vidas entre moradores da região e funcionários da Samarco que trabalhavam na barragem, sem contar os prejuízos incalculáveis à fauna e flora e a contaminação do Rio Doce, por onde a lama toxica escoou até o encontro com o mar em Regência – Linhares/ES
Após um ano, o que foi feito?
Pouco foi feito para reparar os danos causados, apesar de a Samarco afirmar que todos os esforços são concentrados para este fim. Vidas se perderam e estas não podem ser trazidas de volta, espécies de peixes endêmicas do Rio Doce foram extintas e a população ribeirinha foi privada de seu sustento, a pesca.
Passeata pelas ruas de Colatina
O ápice do manifesto foi a passeata que contou com a participação de membros das diversas paróquias da Diocese, membros de associações e ONGs e da população colatinense.
A concentração aconteceu no bairro Lacê, aos fundos da Escola Geraldo Vargas Nogueira, onde realizou-se um ato ecumênico e logo após, o grupo iniciou a passeata que seguiu pela ponte Florentino Avidos que liga as margens norte e sul do Rio Doce. Chegando ao centro da ponte, todos pararam em um minuto de silêncio em luto pelas vítimas e simbolizando a indignação da população diante do descaso por parte dos responsáveis.
Seguindo até o cais da praça Sol Poente, foram lembrados os nomes das vítimas fatais da tragédia. A frente seguia uma faixa marrom carregada pelos participantes, simbolizando a lama toxica que, ao chegar no cais foi posta a margem do Rio.
Finalizando a passeata, Dom Joaquim Wladimir Lopes Dias, Bispo da Diocese de Colatina, leu o Segundo Manifesto e reforçou a disposição da Diocese de Colatina em continuar lutando para que medidas eficazes sejam tomadas por parte do poder público e dos responsáveis. Confira a seguir o manifesto na íntegra:
2º MANIFESTO DA DIOCESE DE COLATINA
UNIDOS PELO RIO DOCE E A SERVIÇO DA VIDA
Colatina, 5 de novembro de 2016
Um ano após o desastre socioambiental ocorrido no Rio Doce, o que mudou?
Em favor da dignidade da pessoa humana e do cuidado com a casa comum, a Diocese de Colatina vem a público, pela segunda vez, manifestar sua dor pelo desastre ocorrido no Rio Doce após o rompimento da barragem de Fundão com rejeitos de minério, em Mariana (MG), pertencente à empresa Samarco (Vale e BHP). Há exato um ano, em 5 de novembro de 2015, esse desastre ambiental, sem precedentes na história do Brasil, ocasionou a perplexidade e a indignação da sociedade mundial. A vida animal e vegetal foi devastada pela enxurrada de lama tóxica. O distrito de Bento Rodrigues foi simplesmente varrido do mapa. Dezenove pessoas morreram nesse desastre.
Um ano se passou. Mas, nós não esquecemos! Nós não podemos esquecer! Muitas pessoas convivem, até hoje, com as pesadas consequências do desastre. Suas vidas nunca mais serão as mesmas. Algumas perderam entes queridos. Outras perderam o fruto de seu sustento: o rio, seus peixes, sua flora, sua água. Muitos agricultores, indígenas, ribeirinhos e pescadores enfrentam a mais dura realidade: falta de comida, de água potável, de trabalho. Por isso, não podemos esquecer!
Para além das consequências socioambientais, o desastre provocado pela Samarco vem destruindo também princípios e valores culturais e morais a serviço da vida nas comunidades atingidas.
A Campanha da Fraternidade 2016, dedicada à casa comum, afirma que “garantir os direitos essenciais para a vida humana e cuidar bem do planeta são partes fundamentais da justiça exigida por Deus”. Não devemos perder a capacidade de lutar e se indignar com aquilo que não condiz com a prática cristã. E Jesus nos encoraja nessa missão ao dizer: “felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados” (Mt 5,6).
Em sua encíclica Laudato Si’, o Papa Francisco lamenta que “a nossa casa comum parece transformar-se cada vez mais num imenso depósito de lixo” (LS 21). O Santo Padre enfatiza ainda: “o fato de insistir na afirmação de que o ser humano é imagem de Deus não deveria fazer-nos esquecer que cada criatura tem uma função e nenhuma é supérflua. Todo o universo material é uma linguagem do amor de Deus, do seu carinho sem medida por nós. O solo, a água, as montanhas: tudo é carícia de Deus” (LS 84).
Diante de tais constatações, exigimos da Samarco e do poder público:
1 – A responsabilização criminal pelas 19 mortes ocasionadas e pelos danos socioambientais provocados;
2 – Medidas eficazes e imediatas pelo dano ocorrido aos municípios, especialmente em relação à melhoria da qualidade da água tratada;
3 – Compromisso efetivo dos prefeitos e vereadores eleitos no sentido de cobrar da Samarco e do poder público a solução dos problemas causados.
Às comunidades eclesiais da Diocese de Colatina, convocamos para que, no próximo dia 5 de novembro de 2016, às 15 horas (data e horário do rompimento da barragem), sejam tocados os sinos das igrejas em sinal de protesto pelo descaso da Samarco e pela morosidade do poder público, bem como em solidariedade com todas as vítimas da tragédia.
Ao longo desta década, atualizaremos os dados e discutiremos o que, de fato, mudou após a tragédia no Rio Doce, bem como se os responsáveis têm cumprido o seu papel social diante do mal causado.
Fraternalmente,
Dom Joaquim Wladimir Lopes Dias
Bispo da Diocese de Colatina